Mal tinhamos pousado o último romance da série "The Expanse" e eis que é divulgada a capa do novo romance: "Cibola Burn.
Esperemos que a grande qualidade dos anteriores continue neste.
Um Livro por dia...
a teoria da maçã na versão em papel.
sábado, 7 de setembro de 2013
Série "The Expanse": Leviathan Wakes, Caliban's War, Abaddon's Gate
Alguém lhe chamou uma “Kickass Space Opera” mas é muito mais
do que isso. Os três livros que constituem a série “The Expanse” – Leviathan
wakes, Caliban’s war e Abaddon’s gate – são plenos de acção, tramas policiais,
combates entre naves, acções de fuzileiros e situações limites.
James S. A. Corey é o pseudónimo usado por Daniel Abraham e
Ty Franck, este último assistente de George R. R. Martin. Ao contrário de
muitas séries escritas de maneira que para a compreensão do conjunto da
história se seja obrigado a ler todos os livros, estes autores construíram três
livros que podem ser lidos de forma autónoma dando ao leitor, de forma subtil e
sucinta, em breves pinceladas,uma visão do conjunto da série. Talvez que numa
apreciação pessoal ache o último o menos conseguido mas no seu conjunto são de
facto três excelentes romances de ficção cientifica.
Estamos num cenário em que a Humanidade já saiu do seu
planeta de origem para se espalhar por todo o sistema solar e olha com
ansiedade para as estrelas distantes. E aqui evoluem as personagens num
permanente conflito consigo mesmas. Podíamos estar no Egipto de Ramsés, na
corte de Carlos Magno ou na Europa da Iª Guerra Mundial mas a acção humana
pouco mudaria.
Comum a todos os romances um conjunto de personagens principais.
Jim Holden e os seus fiéis amigos – Naomi Nagata, Amos Burton e Alex Kamal –
unidos depois da misteriosa destruição da nave cargueiro “Canterbury” em que
eram tripulantes e na posse de uma nave espacial militar topo de gama, vão
encontrar-se, voluntária ou involuntariamente, no olho do furacão dos maiores
conflitos do sistema solar. Jim Holden é uma espécie de anti-herói, cavaleiro
da triste figura, simples e directo, permanentemente em busca de si mesmo e uma
personagem inesquecível.
A Terra e Marte são as novas superpotências do sistema
solar. Militarmente poderosas e actuando como é norma das superpotências. Nos
limites do sistema, na cintura de asteróides, vive uma humanidade que luta pela
sobrevivência no dia-a-dia em condições difíceis. Os asteróides são uma espécie
de países do terceiro mundo que todos procuram explorar. Aí existem também
grupos rebeldes que procuram unificar a luta contra os grandes planetas e a ONU
que os representa.
E no meio de tudo isto surge, vinda dos confins do espaço e
do tempo, uma protomolécula, capaz de modificar a biologia do Homem. Em vez de
se unir para a compreender e evoluir, a humanidade é dominada pelos interesses
particulares e obscuros de grandes conglomerados que dela se querem apoderar em
proveito dos seus interesses privados e as experiências que com ela fazem
conduzem a enormes genocídios.
Se Jim Holden e os seus amigos atravessam todos os romances,
em cada um deles os autores oferecem-nos um conjunto de outros personagens
admiráveis.
O detective Miller é o oposto do utópico e sentimental Jim
Holden. Racional, obsessivo no seus trabalho policial e no seu amor, capaz das
tomar as decisões mais difíceis, com uma paixão assolapada por uma mulher
desaparecida que só conhece das suas investigações.
Frederick Johnson, dirigente da Aliança dos Planetas
exteriores (OPA), é uma espécie de Coronel Kurtz, que abandona a carreira
militar prestigiada ao serviço de um dos planetas para ser o dirigentes dos
grupos rebeldes.
Chrisjen Avasarala e a fuzileiro Roberta Draper (Bobbie) é
outra dupla notável de personagens. Avasarala é um alto cargo da ONU,
conhecedora dos seus meandros, capaz de
alianças improváveis para alcançar um bem maior, exímia a desmontar os mais
secretos complots no seio da organização. Bobbie, simples mas eficaz fuzileiro,
habituada a viver nos limitados horizontes militares, é transformada no braço
direito de Avasarala, mergulha no mundo estranho da política internacional, e
transforma-se na ajuda muscular necessária a Avasarala para atingir os seus
objectivos.
Praxidike Meng, um pai que vê a sua filha Mei desaparecer
misteriosamente para ser usada como cobaia humana e que a procura
incansavelmente pelo sistema solar, com risco da própria vida.
E no terceiro romance surgem Anna Volovod e Carlos c de
Baça, mais conhecido por “Bull”. Anna é uma sacerdote de uma pequena igreja,
mãe de família e que vai enfrentar as estranhas alianças dos representantes das
grandes Igrejas. “Bull” é um militar ao serviço da OPA que não hesita em
enfrentar a hierarquia e transformar inimigos em amigos para aquilo que acha
ser moralmente correcto.
Em cada romance vemos surgir e evoluir um conjunto de
personagens profundamente humanas sempre em conflito aberto entre as suas
fraquezas e virtudes.
São dos melhores romances do género que apareceram nos anos
mais recentes. Acção quanto baste, suspense, situações limite a porém á prova
os que nela se vêem envolvidos, imagens cinematográficas muito para além do tem
aparecido no género. Já houve alguém que disse que estes romances causam em nós
o mesmo espanto quando vimos o primeiro filme das “Star Wars”e é bem verdade.
A não perder de maneira nenhuma!
Título: Leviathan Wakes
Autor: James S. A. Corey
Editor: Orbit
Data: 2011
Pags:562
ISBN: 9781841499895
Título: Caliban’s War
Autor: James S. A. Corey
Editor: Orbit
Data: 2012
Pags:597
ISBN: 9781841499901
Título: Abaddon’s Gate
Autor: James S. A. Corey
Editor: Orbit
Data: 2013
Pags:541
ISBN: 9781841499925
terça-feira, 25 de junho de 2013
"Railsea", China Miéville
Abrir a primeira página de um livro de China Miéville é como
estar em frente á Barragem do Castelo de Bode no momento em que ela rebenta.
Mas não são milhões de metros cúbicos de água que nos submergem mas sim uma
imaginação imensa e uma escrita voluptuosa.
É o que nos acontece mais uma vez quando abrimos este
“Railsea”. Temos de fluir com a leitura, as palavras e a imaginação para não
soçobrarmos.
O mundo é composto de carris. Carris de caminho de ferro.
Toda a terra está coberta por carris que se cruzam e entrecruzam, que volteiam
sobre si mesmos, carris que mergulham na terra por túneis, carris ponteados por
agulhas e sinais.
Debaixo dos carris e da terra vivem estranhos e gigantescos
seres, toupeiras gigantes ou imensas tartarugas.
Todo esse mundo de carris é percorrido por comboios de todos
os tipos: eléctricos, a diesel, a carvão, á vela.
O jovem Shamus Yes ap Soorap embarca pela primeira vez,
ainda indeciso do que quer ser na vida, num comboio caçador de toupeiras, o “Medes”,
do Capitão Naphil. É ajudante do médico do comboio.
O Capitão Naphil tem, como muitos outros comandantes de
comboios, uma “filosofia”. E a sua filosofia é “amarela”: caçar uma toupeira
gigante amarela, um monstro das profundidades.
Neste “Mobydick” sobre rodas, “Medes” e Sam vão deparar-see
com um velho destroço abandonado e nesse comboio acidentado encontram
informação que lhes vai mudar a rotina de caçadores de toupeiras.
Sam vai ser perseguido e ameaçado por piratas, caçadores de
destroços, comboios da armada transformados em corsários e muitos outros
aventureiros. Todos querem o segredo encontrado no comboio destroçado dos pais
dos Strokes, um rapaz e uma rapariga. Com Sam também eles partem em busca do
caminho interrompido pela morte dos pais: saber o que há para além do Mar de
Carris e como ele surgiu.
Apoiado numa escrita plena de onomatopeias e adaptada ás circunvoluções
da linha férrea, Miéville arrasta-nos nesta aventura que corre sobre o aço mas
que permanentemente nos transporta para o mundo aquático e para a peregrinação
do Capitão Ahab no seu “Pequod”. É um “Moby-dick” que corre num mundo estranho
e metalúrgico, como estranho também estranho era o oceano onde navegava o “Pequod”.
Já não é o primeiro romance de Miéville em que a linguagem e
a sua expressão gráfica ou sonora dá a base de desenvolvimento da história que
nos conta.
Também neste “Railsea” foi um enorme prazer chegar a terra
firme ao concluir a última página do livro e ter sobrevivido ás profundezas da
sua imaginação. E até aprender alguma coisa como a questão do deficit e dos
juros da dívida podem ter consequências graves no nosso país.
Título: Railsea
Autor: China Miéville
Editor: Pan Books
Data: 2012
Data: 2012
Num.pags: 376
ISBN: 9781447213673
sexta-feira, 7 de junho de 2013
"Les chevaliers teutoniques", Henry Bogdan
Um círculo completo, não perfeito, mas completo, é o que
podemos dizer acerca da história da Ordem dos Cavaleiros Teutónicos.
Henry Bogdan, neste seu “Les Chavalier Teutoniques”,
desenha-nos este círculo ao longo de vários séculos.
Começa o desenho com a presença tardia dos alemães na Terra
Santa e um mal documentado aparecimento de um hospital de Santa Maria dos
Alemães que terá recolhido cavaleiros alemães feridos nos combates, bem como
peregrinos doentes. Irá colocar-se sob a direcção dos Hospitalários de
Saint-Jaen. Com a presença cada vez mais numerosa de alemães da região esta
Ordem irá desenvolver-se e em 1199 um documento pontifical precisa que a ordem
será submetida á regra dos Hospitários e os irmãos cavaleiros á Ordem dos
Templários, usando um manto branco com uma cruz negra no ombro ao contrário da
vermelha dos Templários. Com um recrutamento e enquadramento exclusivamente
alemão é então que se começa a falar de um Ordem Teutónica ( der Deutsche Orden
ou der Deutsche Ritterorden).
A selecção de um frade originário da Turíngia – Hermann von
Salza – para grão-mestre da Ordem vai dar um enorme impulso á já então poderosa
Ordem. Os dotes diplomáticos deste frade irão exercer-se durante largos anos
entre o Império Alemão e o Papado.
Mas se bem que a partir do seu castelo de Monfort
(Franc-Chastiau) na Terra Santa, a Ordem é aí uma potência, Salza apercebe-se
desde cedo que os futuro tenderá a favor dos árabes na região e começa a
procurar outros destinos para a Ordem.
E é nas fronteiras leste da Europa, que esse destino vai ser
encontrado.
Fiel á máxima de não colocar todos os ovos no mesmo cesto,
Hermann von Salza, aproveita uma oportunidade de estabelecer a Ordem na
Hungria, aceitando a oferta de André II da Hungria para ocupar um imenso espaço
na zona da Transilvânia. Pela mão dos Teutónicos estas terras quase desabitadas
irão ser povoadas de colonos alemães e salpicadas de construções militares para
enfrentar as ameaças nas fronteiras. Este Burzenland vai, pela mão dos
Cavaleiros, constituir-se quase num estado dentro do Estado Húngaro. Em 1225,
todavia, cansado de ver o poder e os privilégios obtidos pela Ordem, será o
próprio rei da Hungria que os irá afastar do reino.
O modelo seguido na Hungria – povoamento por colonos
alemães, construção de castelos em pontos estratégicos – será aplicado numa
escala ainda maior num novo território – a Prússia – a partir de 1230.
Na terra dos pruss,
a Ordem vai ser a ponta de lança contra as diversas tribos lituanas da região.
Serão anos e anos de ferozes combates contra as tribos locais, ao abrigo da
“evangelização” cristã, mas no inicio do sec. XV estará atingido o apogeu da
Ordem Teutónica, um estado dirigido por homens de Deus que são simultaneamente,
frades e soldados.
Henry Bogdan dá-nos uma descrição muito detalhada da
constituição deste estado e da forma de organização da Ordem que lhe permitiu
controlar a colonização desta nova fronteira leste da Europa e intervir como
parceiro muito activo no comércio através da Liga Hanseática.
E é o desenvolvimento desta burguesia das cidades nascidas
do imenso comércio da região do Báltico que vai gerar as primeiras contradições
com a Ordem, demasiado presente em todas as actividades. Mas será com o
aparecimento do imenso Estado Polaco- Lituano que a Ordem enfrentar os mais
duros combates que irão pôr em causa a sua própria existência.
Ao longo de interessantes páginas, o autor vai-nos relatando
como também o estabelecimento da reforma luterana nos estados alemães e na
região vai socavar os alicerces da Ordem.
Correm os séculos e Ordem dos Cavaleiros Teutónicos vai
definhando, atravessando, cada vez mais débil, a Revolução francesa, Napoleão e
o desaparecimento do Império Austro-Hungaro.
Vamos encontrá-los na I Guerra Mundial a exercer a vocação dos primeiros
cavaleiros na Terra Santa: o socorro aos feridos de guerra dos dois lados do
conflito.
É ligados, como Ordem Clerical dos Irmãos Alemães de Santa
Maria de Jerusalém, que no fim do sec. XX, os vamos encontrar. O fecho do
círculo.
Interessante e útil livro sobre a história desta Ordem menos
conhecida do que a dos Templários e dos Hospitalários e, principalmente, sobre
a evolução histórica desta zona da Europa, ainda hoje perdida nos imensos
nevoeiros dos séculos, para muitos europeus ocidentais.
Título: Les chevaliers teutoniques
Autor: Henry Bogdan
Editor: Perrin – tempus nº15
Data: 2002
Pags.: 228
ISBN: 9782262018917
quinta-feira, 2 de maio de 2013
"The Drowned Cities", Paolo Bacigalupi
Podia ser a Etiópia, o Uganda ou o
Darfur mas estamos algures numa costa dos Estados Unidos, num qualquer ano do
futuro. O aquecimento global levou á subida radical do nível das águas do mar,
as cidades foram devastadas, abandonadas pelos seus habitantes naturais. A
selva, vegetal e humana tornou-se dona e senhora desses locais, novos seres
predadores (fruto de alterações genéticas) apareceram, o panorama político
mudou radicalmente neste novo mundo e os grandes conglomerados adaptaram-se á
nova situação continuando novas formas de exploração.
Este é o ambiente em que nos rodeia
em “ The Drowned Cities” de Paolo Bacigalupi. Exércitos de crianças-soldados
disputam ferozmente essas zonas fazendo o rabisco dos restos da civilização
para negócio com as grandes empresas. A população sobrevive miseravelmente
evitando ser recrutada ou como soldados ou como escravos desses exércitos. A
sobrevivência é o objectivo essencial para o mundo vegetal, animal e humano.
A China, a nova grande potência,
procura através de forças pacificadoras, repor a civilização perdida e fazer
desaparecer os bandos que lutam ferozmente entre si mas apenas acaba por ser
afastada para deixar atrás de si novos restos de civilização e uma população de
mestiços odiada pelos locais.
Um ser Aumentado, construído
geneticamente para ser uma máquina de matar, uma rapariga mestiça e um rapaz
sobrevivente ao assassinato dos seus pais vão cruzar os seus caminhos e
destinos e desenvolver estranhas amizades e lealdades. Cada um deles tem os
seus objectivos próprios mas isso irá apenas fortificar essa estranha relação e
não destruí-la.
Paolo Bacigalupi tira-nos um
instantâneo deste mundo infernal e nele nos enfia completamente. Sentimos
plenamente esta atmosfera miasmática, o cheiro do sangue e da podridão, mergulhamos
os pés na terra pantanosa, horrorizamo-nos com a violência fácil dos bandos
armados e o terror dos poucos civis sobreviventes.
A atmosfera desta Terra modificada
pelo aquecimento climático, a Humanidade que cria e os protagonistas,
simultaneamente simples e complexos que desenha é um tema já abordado num outro
romance que, com este, constitui como que um fresco. Este futuro não é tão
longínquo como aparenta. O caos da guerra que abandonou as características dos
exércitos regulares e as suas convenções, para dar lugar a senhores da guerra
que sobrevivem apenas pelo terror que impõem ás populações é nosso
contemporâneo e em várias zonas do planeta as alterações climáticas já fazem
sentir os seus efeitos.
É para essa nossa trágica
contemporaneidade que este “The Drowned Cities” nos faz olhar não através de
uma grande construção romanesca mas sim através da estranha inter-vivência de
poucos protagonistas.
Se com “The Windup girl”, obra com
que ganhou os prémios Hugo e Nébula, estamos perante um vídeo 3D aqui estamos
perante uma Polaroid, com toda a riqueza plástica e prazer que uma Polaroid nos
dá.
Título: The Drowned Cities
Autor: Paolo Bacigalupi
Editor: Atom Books
Data: 2012
Pags: 437
ISBN: 9781907411113
Título: The Drowned Cities
Autor: Paolo Bacigalupi
Editor: Atom Books
Data: 2012
Pags: 437
ISBN: 9781907411113
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